Flávio Josefo é considerado como um dos maiores historiadores judeus de sua época, e além de escrever sobre a História dos Judeus
e suas guerras, também escreveu sua autobiografia, na qual se descreve
como filho de Matias o sacerdote judaico, nascido em Jerusalém,
instruído pela torá e adepto do farisaísmo (JOSEFO, Flávio, História dos Judeus
– CPAD, 2000, pp.476-495). O seu testemunho é importante, pois é
provavelmente o único relato sobrevivente de uma testemunha ocular da
destruição de Jerusalém.
Josefo é considerado como um revolucionário judeu que rendeu-se à
supremacia romana trocando o suicídio pela lealdade a Roma. Por sua
demonstração de lealdade, Vespasiano não apenas o recebeu como cidadão
romano, mas o patrocinou como historiador.
No seu livro Antiguidade dos Judeus, que é normalmente datado na década de 90dC tem duas citações interessantes. A primeira faz clara referência a Tiago "irmão de Jesus chamado Cristo" (GEISLER, Norman, Não tenho fé suficiente para ser ateu – Vida, 2006, pp.227), veja:
Anano, um dos que nós falamos agora, era homem ousado e empreender,
da seita dos saduceus, que, como dissemos, são os mais severos de todos
os judeus e os mais rigorosos no julgamento. Ele aproveitou o tempo da
morte de Festo, e Albino ainda não havia chegado, para reunir um
conselho diante do qual fez comparecer Tiago, irmão de Jesus
chamado Cristo, e alguns outros; acusou-os de terem desobedecido às leis
e os condenou ao apedrejamento. Esse ato desagradou muito a
todos os habitantes de Jerusalém, que eram piedosos e tinham verdadeiro
amor pela observância das nossas leis – (JOSEFO, Flavio, História dos Judeus – CPAD, 2000, pp.465)
Dois fatos são interessantes nessa citação: (1) Confirma uma clara
declaração das escrituras: Jesus tinha um irmão chamado Tiago (Gl.1.19); (2) Ele era reconhecido como Cristo, outra afirmação clara das escrituras (Mt.16.16).
A segunda declaração de Josefo a respeito de Jesus é ainda mais
explícita e por isso, muito controversa. Pouco antes da declaração
supracitada, ele também afirma:
Nesse mesmo tempo apareceu Jesus, que era um homem sábio, se todavia devemos considera-lo simplesmente como um homem,
tanto suas obras eram admiráveis. Ele ensinava os que tinham prazer em
ser instruídos na verdade e foi seguido não somente por muitos judeus,
mas mesmo por muitos gentios. Ele era o Cristo. Os mais ilustres
da nossa nação acusaram-no perante Pilatos e ele fê-lo crucificar. Os
que o haviam amado durante a vida não o abandonaram depois da morte. Ele
lhes apareceu ressuscitado e vivo no terceiro dia, como os santos
profetas o tinham predito e que ele faria muitos outros milagres. É dele
que os cristãos, que vemos ainda hoje, tiraram seu nome – (JOSEFO, Flávio, História dos Judeus – CPAD, 2000, pp.418)
Essa citação tem sido criticada como sendo impossível de ter sido
proferida por um judeu-romano escrevendo sobre a história dos judeus.
Normalmente apela-se par ao fato de que o texto acima é fruto de uma
corrupção cristão tardia, especialmente pelo fato de que Orígenes
(185-253dC) atesta que Josefo não aceitava a Messianidade de Jesus.
Entretanto, essa declaração não é inteiramente verdadeira, observe a
declaração de Orígenes:
Tamanha era a reputação de Tiago entre as pessoas consideradas
justas, que Flávio Josefo, que escreveu Antiguidade dos Judeus em vinte
livros, quando ansiava por apresentar a causa pela qual o povo teria
sofrido grandes infortúnios que até mesmo o tempo fora destruído, afirma
que essas coisas aconteceram com eles de acordo com a Ira de Deus em
consequência das coisas que eles se atreveram a fazer contra Tiago o
irmão de Jesus que é chamado Cristo. E o que é fantástico nisso é que,
apesar de não aceitar Jesus como Cristo, ele deu testemunho da justiça
de Tiago – (Orígenes, Origen's Commentarary on Matthew, IN: ROBERTS, Alexander, DONALDSON, James, Ante-Nicene Fathers, VOL 9, pp.424)
Considerando o fato de que Orígenes atesta que Josefo o chama de
Cristo (como vimos que o faz quando fala sobre Tiago), embora não o
considerasse como tal, não é impossível que a citação seja de fato verdadeira.
Porém, devemos reconhecer que algumas das declarações desse texto
atribuído a Josefo parecem por demais cristãs para serem de um fariseu, e
entendemos que não é à toa que tenha sido considerada uma interpolação.
Edwin Yamauchi, professor emérito de história na Universidade de
Miami, comenta essa citação de Josefo e explica que é possível perceber
onde estão as interpolações, ou supostas alterações cristãs tardias. Ele
argumenta que era incomum para um cristão referir-se a Jesus Cristo
apenas como um homem sábio, o que sugere que o texto nesse caso é de
Josefo. Por outro lado, parece improvável que um judeu sugeriria que ele
não era simplesmente um homem. Nesse caso, Yamauchi atesta que esse é
um possível caso de interpolação cristã tardia. Sobre a expressão "Ele
ensinava os que tinham prazer em ser instruídos na verdade e foi
seguido não somente por muitos judeus, mas mesmo por muitos gentios",
Yamauchi defende que está em conformidade com o estilo e vocabulário de
Josefo, mas a conclusão "Ele era o Cristo" parece direta demais para um
judeu (STROBEL, Lee, Em defesa de Cristo, Vida, 1998, 104).
Contudo, ainda que tal citação de Josefo possa ser tomada com algumas
ressalvas, é importante lembrar que uma versão árabe do texto de Josefo
no mesmo trecho, que embora tenha as partes mais criticadas ausentes,
apresenta aspectos interessantes sobre Cristo, observe:
Nessa época havia um homem sábio chamado Jesus. Seu comportamento era
bom, e sabe-se que era uma pessoa de virtudes. Muitos dentre os judeus e
de outras nações tornaram-se seus discípulos. Pilatos condenou-o à
cruficicação e à morte. E aqueles que haviam sido seus discípulos não
deixaram de seguí-lo. Eles relataram que ele lhes havia aparecido três
dias depois da crucificação e que ele estava vivo [...] talvez ele fosse
o Messias, sobre o qual os profetas relatavam maravilhas – (GEISLER,
Norman, Enciclopédia de Apologética – Vida 2002, pp.449)
Após apresentar essa versão do texto de Josefo, em outro livro Geisler explica sua preferência por essa leitura:
Existe uma versão dessa citação na qual Josefo afirma que Jesus era o
Messias, mas a maioria dos estudiosos acredita que os cristãos mudaram a
citação para que fosse lida dessa maneira. De acordo com Orígenes, em
dos pais da igreja nascido no século II, Josefo não era cristão. Desse
modo, é improvável que ele pudesse afirmar que Jesus era o Messias. A
versão que citamos aqui vem de um texto árabe que, acredita-se, não foi
corrompido – (GEISLER, Norman, Não tenho fé suficiente para ser ateu – Vida, 2006, pp.227)
Diante dessas informações, devemos ainda lembrar os leitores que a
credibilidade de Josefo como historiador já foi colocada a prova
diversas vezes. Em um provocativo livro chamado Jesus e Javé, o judeu ateu Harold Bloom logo de início apresenta sua visão acerca de Cristo e Josefo:
Não há fatos comprovados acerca de Jesus de Nazaré. Os poucos fatos
que constam na obra de Flávio Josefo, fonte da qual todos os estudiosos
dependem, são suspeitos, pois o historiador era José bem Matias, um dos
líderes da Rebelião Judaica, que salvou a própria pele por ter bajulado
os imperadores da Dinastia Flaviana: Vespasiano, Tito e Domício. Depois
que um indivíduo proclama Vespasiano como Messias, ninguém deve mais
acreditar no que tal pessoa escreve a respeito do seu povo. Josefo,
mentiroso inveterado, assistiu, tranquilamente à captura de Jerusalém, à
destruição do Templo e à matança dos habitantes – (BLOOM, Harold, Jesus e Javé, os nomes divinos – Objetiva, 2006, pp.31)
Nesse momento temos que fazer uma importante pergunta: "O que ganharia esse judeu traidor nacional em mencionar a figura de Jesus?".
Considerando o fato de que era financiado por Roma, era de se esperar
que sua visão pudesse ter sido comprada pelos romanos e sua história
tenha cedido em alguns lugares à tentação de ser conscientemente
impreciso o que o levou a ganhar a fama de mentiroso inveterado.
Contudo, aos olhos de Roma, essa nova "religião" tinha
claras tendências de ser facciosa ao Império em função do seu estranho
conjunto de doutrinas e sua objetiva recusa de adorar ou a César ou aos
deuses romanos. Com isso, era de se esperar que ele suprimisse qualquer
evento, fato ou personagem que pudesse o colocar em oposição com seus
patrocinadores.
Portanto, é evidente que não haveria qualquer ganho para Josefo em
apresentar a pessoa de Jesus, e talvez, por essa mesma razão, é que ele
tenha escrito tão pouco a seu respeito. Mas, ainda assim, com o
testemunho de Josefo, nós podemos reconhecer algumas das características
de Cristo e sua história, tal como contada pelos evangelistas:
(1) Jesus foi um homem considerado sábio;
(2) de bom comportamento e virtudes;
(3) tinha um irmão chamado Tiago
(4) teve muitos seguidores de diferentes nacionalidades;
(5) foi crucificado por Pilatos;
(6) por crucificação;
(7) nem por isso seus discípulos o abandonaram;
(8) eles relataram a ressureição de Cristo após três dias;
(9) além de uma possível relação com o Messias anunciado pelas escrituras hebraicas.
Fonte do texto: http://marceloberti.wordpress.com/2011/04/29/josefo-e-a-historicidade-de-cristo/
Fonte: e-cristianismo
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